Em 29 de outubro de 2011, o portal de notícias Terra publicou uma matéria intitulada “Historiador: ligar neonazismo a imigração alemã é irresponsável”. Como o historiador em pauta sou eu, preciso dizer algumas palavras a respeito.

 

Depois de ter tentado, em vão, publicar, na “grande imprensa”, alguma coisa sobre a atitude que considero irresponsável de ligar, publicamente, “neonazismo” com imigração alemã – a última tentativa de publicar algo foi feita na seção “Artigos” de Zero Hora, algumas semanas atrás –, fui procurado, de forma totalmente espontânea, pelo jornalista Daniel Favero, do Terra.

http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI5425574-EI5030,00-Historiador+ligar+neonazismo+a+imigracao+alema+e+irresponsavel.html

Conversamos cerca de duas horas, e o texto referido é o resultado dessa conversa. Em primeiro lugar, devo parabenizar, publicamente, o jornalista pelo esforço de reproduzir da forma mais fiel possível, dentro de um espaço exíguo, o cerne da nossa conversa. A não ser que, no futuro, venha a utilizar a conversa de outra forma (inadequada) em outro lugar ou em outro momento, atitudes como a dele são louváveis – já falei a muito jornalista que, depois, recortou de forma preconceituosa ou distorcida minhas palavras. Não é caso de Daniel Favero.

Como a conversa foi longa e entremeada de buscas na Internet e de consultas a documentos, passaram alguns detalhes, que me apresso a consertar – mas repito, não há nenhum erro de essência. Uma primeira observação refere-se ao delegado Paulo Cesar Jardim, a quem peço, humildemente, desculpas pela rudeza dos termos da afirmação de que, a partir de novembro de 2010, “passou a falar bobagem”, sobre o assunto “neonazismo”. Como o jornalista me perguntou se poderia deixar o gravador ligado, e eu autorizei, essa frase, efetivamente, foi dita por mim, mas ela poderia ter sido omitida na publicação, sem perda de conteúdo. A honestidade do jornalista, por outro lado, porém, deixa muito clara minha insistência em dizer que, até novembro de 2010, considerei exemplar o trabalho do delegado Jardim, no combate ao “neonazismo” – coisa que também está atestada em várias passagens deste meu site.

Preciso consertar o próprio contexto dessa afirmação, que liga o momento em que, na minha opinião, o delegado começou a “desandar” em relação ao tema com a eleição de Tarso Genro. O que aconteceu durante a entrevista foi que, ao abrirmos o site http://flitparalisante.wordpress.com/2011/08/16/claudio-julio-tognolli-os-policiais-federais-de-todo-o-brasil-ainda-nao-sabem-qual-o-rosto-que-a-presidente-dilma-quer-dar-a-sua-pf-corrupta-violenta-empresarial-republicana-ou-customizada-a/, no qual um jornalista – que me é totalmente desconhecido – faz uma análise, se entendi bem, negativa sobre os efeitos da gestão Tarso Genro, no Ministério da Justiça, para as formas de atuação da Polícia Federal, citando, em meio ao texto, uma exceção no fato de que a única coisa positiva da atuação do agora governador, no campo policial, teria sido a de ter dado carta branca ao delegado Jardim para combater o “neonazismo”. E, nesse contexto, ao observar, claramente, que a linguagem do jornalista não me inspirava nenhuma confiança, eu disse que, do ponto de vista estritamente cronológico, a afirmação faz sentido, pois a fala do delegado Jardim, com a nova orientação sobre o papel dos “alemãos” como origem do “neonazismo”, aconteceu no Senado da República, em 19 de novembro 2010, portanto, não muito depois da eleição de Tarso Genro. Eu, porém, não afirmei que a informação seja verdadeira, ou que esta seja minha opinião.

Devo dizer também que a história dos luteranos negros na região de Canguçu não provém de pesquisa minha – o copyright dessa história é da professora Dilza Porto Gonçalves, que foi minha orientanda no mestrado em História da PUCRS (agora faz doutorado sobre outro tema com outra orientadora).

Por último, no campo estritamente informativo, preciso dizer que também sou professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Dito isso, cabem mais algumas palavras em relação ao delegado Paulo Cesar Jardim. Segundo a matéria, ao ser questionado sobre minha posição, teria dito: "não quero contestá-lo [o professor René Gertz]. O meu conhecimento é oriundo dos próprios documentos apreendidos com eles (neonazistas) e de depoimentos deles prestados na delegacia". Insisto: que dizem esses documentos? Eles só apareceram em 2010, depois da localização do material com, supostas ou efetivas, ameaças ao senador Paulo Paim? Caso contrário, por que o delegado não falava disso antes de novembro de 2010? Em relação aos depoimentos, uma das coisas sensatas da dissertação da antropóloga Adriana Abreu Magalhães Dias é aquilo que ela chama de “teutonismo virtual”, o que significa que essas pessoas são apenas virtualmente “alemães”, isto é, se dizem alemães sem sê-lo. Há um caso típico de uma moça no Paraná, classificada de totalmente transtornada pela polícia local, que, inclusive, se diz perseguida étnica, que estaria sendo presa não por atos "neonazistas",  mas, unicamente, por ser “alemã”, sem que ela tenha qualquer coisa de efetivamente alemão. É preciso cuidar para não confundir fala, discurso com realidade. Em resumo: quais são as provas concretas que o delegado possui contra o conjunto do povo da "colônia alemã"? Os próprios comentários de leitores no portal Terra em relação à matéria mostram que gente muito destrambelhada existe em qualquer lugar, de qualquer origem (pelo conteúdo, os comentários não podem ser de "alemães" - e leia as asneiras que estão ditas ali). Mas isso significa que o povo todo seja destrambelhado? Claro que não! No entanto, se alguém vai à imprensa e diz: "os descendentes de alemães são responsáveis pelo 'neonazismo'", a "leitura" dessa frase feita pelo senso comum, obviamente, será a de que são todos umas bestas criminosas, já que ser "neonazista" é crime. Caramba! Tente dizer algo equivalente em relação a alguns outros grupos! Tente, delegado! Tente! Só para vermos que acontece!

A propósito, confira-se que o delegado Jardim afirmou em julho de 2009, sobre o frenesi produzido pela indústria do "neonazismo", naquele momento (http://www.leouve.com.br/geral/serra/regiao/ver/regiao_polacia_civil_diz_que_serra_nao_tem_grupos_de-38195.html):

"Foi um grande exagero. Na realidade, nós tivemos um menino do Alto Taquari que estava envolvido em um crime cometido no Paraná. É claro que nós temos algumas pessoas que simpatizam com este movimento, mas a base não é a Serra, não. A base é Porto Alegre. Então, eu digo com a maior tranquilidade, a situação não é tão contundente quanto pareceu. Não há grupos na Serra. Podemos definir pessoas isoladas, mas grupos atuantes não existem".

Ou seja, primeiro se emporcalha a dignidade de milhares de seres humanos, ao se fazerem declarações bombásticas que, sem dúvida, desencadeiam, entre a população, prevenções contra determinados grupos que habitam as regiões em que se diz estarem agindo legiões de "neonazistas" (a deputada Maria do Rosário Nunes requer a CEXNEONA, que inclui, expressamente, a convocação do delegado Mauro Mallmann, de Teutônia) - só depois se investiga, e constata que essas legiões não existem, que, de fato, se deu uma baita ajuda a bandos de criminosos interessados em fomentar a indústria do "neonazismo" e disseminar o ódio étnico (estou pensando, de forma concreta, nos criminosos que cometeram o atentado contra o povo de Teutônia, em agosto de 2010 - atentado que até em sites produzidos dentro de renomadas universidades continua aparecendo como tendo sido praticado pelo povo teutoniense, e o Ministério Público Federal de Lajeado, até hoje, está embrenhado no município, caçando "neonazistas"!).

[Para evitar qualquer mal-entendido: o delegado Jardim, nesta época, ainda não tinha dado a guinada de que falo em outro lugar deste site, claramente constatável, no mínimo, desde novembro de 2010, e, por consequência, ele não tem nada a ver com o referido emporcalhamento da dignidade do povo de Teutônia, ocorrido em 2009. Mas justamente por isso, chama tanta atenção o fato de que, menos de um ano e meio depois, o mesmo delegado fizesse declarações no sentido de que vigoraria a mais absoluta barbárie "neonazista" no Rio Grande do Sul, e, agora, sim, as bestas [não é palavra dele, mas certamente imaginada por muita gente] dos "alemãos", efetivamente, seriam os responsáveis por isso. Entenda-se!] [parágrafo acrescentado em 23/12/2011].

A responsabilidade que o delgado Jardim e eu temos, para tentar evitar que este estado vire uma Bósnia, sugere que se deve estudar muito bem e a fundo essa questão. É perigoso demais emitir juízos, em público, sobre esse tema, a partir de um ou dois indícios. Ninguém pode dizer que este site não apresenta uma grande quantidade de contraprovas e contra-argumentos à tese do senso comum, e quem é responsável não pode aceitar verdadeiras barbáries, como o vídeo que está aqui na nota “Safadeza” – uma falsificação criminosa, que injuria, calunia milhares de descendentes de alemães, sem qualquer base factual, ao dizer, ao menos de forma indireta, que seus avós ou pais se armaram até os dentes para entregar o Brasil a Hitler, crime contra o qual, porém, nenhuma autoridade policial ou judiciária, até agora, tomou providências. Que esse tipo de publicação cria, no senso comum, ódios, sem qualquer base, pode-se ver nas citadas reações à matéria do Terra. Além de coisas bem humoradas, como de ex-alunos meus, que sabem quem sou, há uma destilação de ódio contra quem discorda do senso comum (uma criatura até me classifica de "antissemita"). A nós dois, delegado Jardim, cabe manter o equilíbrio e o bom senso - no interesse da necessária convivência pacífica da população deste estado. Faço novo convite para um diálogo. Talvez até Jair Krischke possa juntar-se a nós. Talvez também venha o procurador do MPF de Lajeado. Vamos discutir isso, e tentar evitar uma situação que saia do controle! Estou lutando por isso, desde novembro de 2009, quando lancei este site! Repito: uma autoridade que faz afirmações públicas do tipo daquelas por mim criticadas está brincando com fogo! A irracionalidade do comportamento das pessoas (de ambos os lados) é absoluta, nesse campo, até entre pessoas de alto nível de educação formal! [31/10/2011]